Certamente, você já deve ter escutado falar sobre o acelerado processo de envelhecimento humano. Ou que temos mais de 15% da população brasileira acima de 60 anos, ou ainda que a pirâmide etária está invertendo… e por aí vai. Há um mundo de informações sobre a mudança demográfica e epidemiológica no Brasil. Caso ainda não tenha escutado a respeito, tenho certeza que, em breve, essas pautas serão mais corriqueiras nas mídias. De qualquer maneira, se chegou até aqui, você já tem uma ótima visão sobre o que quer para os próximos anos. Pode ser até que não tenha objetivos definidos ainda, e isso não tem problema. O que importa é que você está está no lugar certo para poder começar a delineá-los.
E por qual motivo digo tudo isso? Primeiro para contextualizar o nosso atual cenário. E para poder adentrar numa temática mais delicada – a da importância da reabilitação cognitiva na vida de muitos cidadãos. Sou especialista na área e atuo há mais de 10 anos, além de estar inserida em pesquisas sobre o assunto há 14 anos. Nesta longa jornada, aprendi que um dos maiores medos do ser humano é perder a autonomia, o que me leva a crer que o medo de perder nossas memórias é inerente à nossa espécie. E isso independe do contexto socioeconômico no qual a pessoa se encontra. Ao assistir o documentário na Netflix, “O código Bill Gates”, pude comprovar isso. Quando o entrevistador perguntou ao Bill Gates: “Qual o seu maior medo?” Ele, após uma breve pausa, respondeu: “Não quero que meu cérebro pare de funcionar”. Além disso, vejo diariamente este medo genuíno nas pessoas que atendo em consultório. Dúvidas como: “por que isso acontece comigo?”, “o que eu faço para não perder a memória?”, “será que meu esquecimento é Alzheimer?” , “será que eu vou ficar bobo e perder a noção de tudo?”, “eu vou morrer por causa disso?”, “é normal esquecer desse jeito com a doença?”… Essas são algumas das dúvidas que sempre surgem e representam uma angústia real para quem as tem. E o medo pode paralisar. O que piora ainda mais o cenário de quem precisa estimular o cérebro, seja para prevenção ou para reabilitação.
Isso pode fazer toda diferença na sua vida.
É por isso que gosto tanto de falar sobre longevidade e prevenção, primordialmente. Sempre há o que fazer, e essa magia atribuo à ciência e aos pesquisadores que buscam incessantemente as melhores alternativas sempre! Mas, neste caso, “quanto antes, melhor”. Então, como evitar que nosso maior medo se concretize? Parece clichê, mas está muito relacionado ao nosso estilo de vida ao longo do tempo. Para o que devemos nos atentar então? Para a prática regular de atividade física, para alimentação adequada, para o tratamento correto e responsável de diabetes, hipertensão, depressão, ansiedade, práticas sociais e interação com pessoas, aprender ao longo da vida, ter propósito, buscar meios de alívio de estresse (meios lícitos, por favor, rs), ter crença e uma boa rede de suporte social. Essas são algumas coisas que, se cuidadas diariamente, podem ajudar na prevenção do tão temido Alzheimer, por exemplo. Só isso faz com que você não o desenvolva? Não, mas pode prevenir, postergar o aparecimento da doença ou até mesmo, no caso daquelas pessoas que já têm a enfermidade, diminuir sua velocidade de progressão.
Perfeito, mas e agora? Onde entra a estimulação ou reabilitação cognitiva nisso? Bom, é simples. A estimulação cognitiva entra muito na prevenção e a reabilitação cognitiva no tratamento. Como são realizadas? De maneira personalizada, com direcionamento de atividades elaboradas que ativem os domínios cognitivos (a saber, memória, atenção, linguagem, organização, planejamento, resolução de problemas, controle das emoções, os cinco sentidos, dentre outros) de modo consciente, em grupo ou individualmente. Essas atividades precisam fazer sentido e devem ter aplicabilidade na prática diária da pessoa. Existem benefícios cientificamente comprovados? A resposta é positiva! Sim, existem. E, não apenas benefícios momentâneos, como alguns que perduram por períodos específicos, a depender do estímulo cognitivo realizado.
E o mais gostoso enquanto terapeuta é escutar dos idosos: “Agora consigo lidar melhor com minhas finanças, pois estou mais atento”, “Estou muito feliz, isso me ajuda muito. Já consigo conversar sem ficar esquecendo as palavras ou demorando tanto para lembrar delas”, “Posso escapar de qualquer compromisso, mas não deixo de faltar no grupo da memória, me faz muito bem!”, “Hoje aprendi muito, os temas que você traz são atuais e relevantes”… Tem como não ficar satisfeita ao saber que a ciência na prática é tão gratificante para quem a recebe?! Sou extremamente grata à minha profissão. E, para provocar você, já deixo aqui duas perguntas: Você já ouviu falar sobre estimulação cognitiva? E o que você tem feito para preservar o seu bem mais precioso, a sua memória?
Jessyka Bram Gerontóloga especialista em Reabilitação Cognitiva, Doutora em Psiquiatria – FMUSP
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